Eu nem quero pensar no tempo que algum cromo deve ter gasto para descobrir isto.
Sabiam que a seguinte frase:
" SOCORRAM-ME SUBI NO ONIBUS EM MARROCOS"
( Lida da direita para a esquerda, é exactamente a mesma
coisa??? )
|
Há meses que o Partido Comunista vem enchendo o País com a frase: "Público é de todos; privado é de alguns." Trata-se, sem dúvida, de um slogan elegante, apelativo e contundente. Mas que quererá significar? Considerada em si, a afirmação é claramente falsa. Será que só alguns têm acesso a comida, vestuário e habitação, cujo fornecimento é privado? E será que o Teatro Nacional de São Carlos, o Instituto Diplomático e o ensino superior público são para todos? |
Existe em Portugal uma associação cujo número exacto de membros é desconhecido, e que não se sabe se está a crescer ou a diminuir. Não é uma sociedade secreta. É o Estado português. A semana passada, o ministro das Finanças, falando no Parlamento durante o debate sobre a chamada "lei da mobilidade", revelou ao mundo profano que só a administração central empregaria o número muito detalhado de 580.291 pessoas. Falta saber quantos mais povoam os outros serviços do Estado. A publicação desses números complementares ficou prometido para esta semana. Saberemos finalmente quantos são, de facto, os empregados nas "administrações públicas"? É duvidoso. Porque, no momento em que nos era anunciado o primeiro resultado parcial da contagem de cabeças estatais, discutia-se já o resultado líquido dos movimentos de entradas e saídas de funcionários durante os primeiros seis meses deste ano, sem que ninguém concordasse acerca dos números. Segundo o Diário Económico, o número de funcionários ter-se-ia acrescentado em 10.166 entre Janeiro e Junho de 2006. O secretário de Estado da Administração Pública protestou logo. Invocou uma diminuição de 1,2 por cento da massa salarial, como "sinal de que o volume de trabalhadores está a diminuir". Esta discordância estatística mostra a dificuldade de delimitar o Estado em Portugal. Ninguém sabe, com certeza, onde começa e acaba, e se está a expandir-se ou a encolher. E basta este facto para revelar a vacuidade da política em Portugal. Sendo a redução do célebre "peso do Estado" uma das tais bandeiras que os grandes partidos do regime regularmente roubam um ao outro, conclui-se que os governos têm andado a "emagrecer" uma entidade cujo "peso", no que diz respeito ao número de funcionários, é incerto. Está assim garantida a impossibilidade de alguma vez, por esta via, avaliar com precisão a actividade reformadora deste e de qualquer governo.
O número de funcionários tem sido, no actual regime, um dos grandes temas do debate político. O mesmo já tinha acontecido durante a monarquia constitucional, na segunda metade do século XIX. A única diferença é que, há cem anos, era a esquerda quem exigia a redução dos funcionários, e a direita quem se mostrava mais benevolente para com o crescimento do Estado. A esquerda liberal e republicana do princípio do século XX ainda acreditava, em geral, na revolução por via de um "povo" autónomo e livre. Por isso, encarava o Estado, os seus funcionários e o seu exército, como um enleio a essa acção cívica e popular. A conversão da esquerda à burocracia mostra como, a pouco e pouco, o Estado foi absorvendo as esperanças de quase todos os políticos: entre os conservadores, foi sempre visto como o pilar de uma ordem que passou a contar cada vez mais com a polícia; entre os revolucionários, o Estado começou a ser imaginado como o instrumento de transformações sociais para que as quais se deixou de contar com a vontade do "povo".
Entretanto, os políticos encontraram outra utilidade para o Estado: o de gerar, enquanto empregador, a base de apoio que os líderes de vários regimes desistiram de procurar em movimentos "espontâneos" da chamada "sociedade civil". É o que sugerem os momentos em que houve maior aumento de funcionários. Entre 1919 e 1926, depois da má experiência da I Guerra Mundial (1914-1918), os republicanos tentaram consolidar o seu regime, promovendo a primeira duplicação do número de funcionários da administração central no século XX: de cerca de 16 mil para cerca de 30 mil, enquanto o número de direcções-gerais dos ministérios pulava de 22 para 39. Outra duplicação do mesmo género, num período curto, aconteceu outra vez no século XX. Foi entre 1976 e 1983, para criar bases de apoio à actual democracia: os serviços da administração central de 223 mil para 442 mil. O "número dos funcionários" não traduz apenas a expansão dos serviços públicos, mas a necessidade de criar, a partir de cima e rapidamente, as classes sociais pressupostas pelos projectos políticos de quem dominava o Estado.
Não é surpreendente que, tendo crescido assim, o Estado tenha em si próprio o objectivo da sua actividade. É o que se pode deduzir da importância das despesas com os funcionários e do tipo de trabalho desses funcionários. Segundo Medina Carreira, o Estado português é, na Europa, aquele em que os vencimentos do funcionalismo absorvem maior percentagem dos impostos (45 por cento) e o único que gasta mais em vencimentos do que em transferências sociais. Os funcionários não só consomem uma grande parte dos recursos, mas trabalham sobretudo para si próprios. Em 2004, o Conselho Coordenador do Sistema de Controlo Interno da Administração Financeira do Estado revelou que apenas 40 por cento da actividade dos funcionários consiste em serviços e assistência directa aos cidadãos e às empresas. Sessenta por cento da actividade dos funcionários não tem esses fins de utilidade social: 51 por cento é consumida em burocracia interna e 9 por cento é simplesmente supérflua. É este o segredo do Estado português. Não existe para servir a sociedade, mas constitui, em si mesmo, uma sociedade que os restantes portugueses estão obrigados a servir através dos impostos.
Aquilo a que o presente Governo tem chamado "reformas" consiste numa espécie de ovo de Colombo político. Outros governos obtiveram boas vontades expandindo o emprego público. O presente Governo aproveita o ressentimento geral contra o funcionalismo e as suas "regalias" para submeter e empobrecer os funcionários, oferecendo-lhes a manutenção dos seus postos de trabalho como contrapartida. Ganha pelos dois lados: multiplica os funcionários, ao mesmo tempo que dá ao resto do povo o gosto de assistir ao seu rebaixamento. É a receita mais esperta para manter tudo como está. Resta saber se é desta esperteza que o país precisa.
Advogados e outros profissionais liberais ficaram em estado de choque com as alterações nas condições de exercício das respectivas profissões.
Taxistas, advogados, farmacêuticos e outros profissionais liberais ficaram em estado de choque com as recentes alterações nas condições de exercício das respectivas profissões que o governo de Romano Prodi acaba de introduzir em Itália.
Não sei qual terá sido o peso que nesta decisão teve o estudo sobre o impacto económico da regulação das profissões liberais, encomendado pela Comissão Europeia ao Institut für Höhere Studien em 2003, quando Prodi era o seu Presidente. Mas com grande probabilidade o actual primeiro-ministro não terá esquecido os resultados e as recomendações dessa investigação.
De facto, nesse estudo, a Itália apareceu na linha negra, com índices de intensidade regulatória considerados elevados para todas as profissões que então foram analisadas, a saber, os técnicos de contas, os advogados e os notários, os arquitectos, os engenheiros e os farmacêuticos. As conclusões referiam-se não apenas às condições de entrada no mercado, mas também às regras de conduta impostas ao exercício dessas profissões.
O Decreto que acaba de ser publicado (conhecido por pacote Bersani, o nome do Ministro que o propôs) não só refere as recomendações da Comissão Europeia, como invoca directamente no articulado algumas das liberdades consagradas no Tratado CE, tais como a liberdade de circulação de pessoas e de prestação de serviços e, é claro, a liberdade de concorrência.
Entre outros aspectos, são proibidas as tarifas e honorários previamente fixados, incluindo na forma de preços mínimos. Passa também a ser permitida a publicidade dos títulos, especializações profissionais, características do serviço oferecido e preços dessa prestação. E podem ser fornecidos serviços profissionais de tipo interdisciplinar, associando diferentes profissões, por exemplo, serviços de advocacia, de contabilidade e de aconselhamento de gestão.
Por essa razão o presidente da Associazione Nazionale Praticanti e Avvocati, aplaudiu o fim destas regras que, na sua opinião, serviam apenas para “mumificar o mercado, com prejuízo para os jovens profissionais”.
Mas não foram só os advogados os atingidos pelas medidas de liberalização. Para os estabelecimentos comerciais, acabaram as quotas de mercado predefinidas, o registo obrigatório prévio de requisitos profissionais para outros efeitos que não sejam os que dizem respeito à tutela sanitária dos alimentos e a proibição de promoções, salvo por restrições comunitárias. Pôs-se fim à necessidade de observar uma distância mínima entre estabelecimentos que exercem a mesma actividade (como acontece ainda entre nós com as farmácias) e liberalizou-se a venda de medicamentos não sujeitos a prescrição médica. O Decreto alterou ainda o processo de concessão de licenças de táxis e o regime de transferência de propriedade de bens móveis sujeitos a registo.
Como referiu Romano Prodi, a reforma visa mudar muitos sectores da economia, nos quais comportamentos seculares dificultam a entrada de novas gerações. Algumas das regras que foram banidas ou modificadas eram tão antigas que quase pareciam imutáveis, muito embora há muito fosse evidente que não tutelavam nenhum interesse colectivo relevante.
Na verdade, se olharmos isoladamente para alguns dos regimes que são modificados podemos pensar que se trata apenas de uma pequena reforma, mesmo que exija alguma coragem política para ser assumida. Mas se olharmos para todas as medidas que estão sobre a mesa o panorama muda radicalmente. Vista de Portugal – que partilhou muito tempo e, em certos sectores, conserva ainda o mesmo modelo regulatório, avesso a uma cultura de concorrência – esta mudança assemelha-se a um carro vassoura. Numa só viagem, ele limpou os restos de um corporativismo serôdio que, por distracção ou falta de vontade política, haviam sido deixados por aí. É por isso, que o pacote de Pier Luigi Bersani se parece mais com uma revolução do que com um mero conjunto de pequenas reformas. Só resta esperar para ver se da revolução das palavras que estão na lei passamos à revolução dos actos na vida das profissões em Itália.