Domingo, 11 de Setembro de 2005
O enfoque no cidadão
De: António Carrapatoso
A sociedade civil está prisioneira dum Estado fraco e paternalista que asfixia e desconfia do cidadão e da sua iniciativa.
A nossa sociedade não está organizada nem funciona à volta e em benefício de cada cidadão, ou seja, de cada português, mas sim de grupos representativos de interesses corporativos específicos que, de acordo com o seu poder negocial, exercem uma maior ou menor influência e acabam por determinar maioritariamente o rumo que o País toma.
Caso paradigmático é o do próprio Estado, cujo papel e funcionamento é mais determinado pelos interesses próprios corporativos dos grupos que nele prevalecem, do que pela vontade e necessidades da generalidade dos cidadãos.
A razão principal porque tal acontece é porque somos uma democracia muito recente, sem uma sociedade civil fortalecida, e que ainda não foi capaz de alterar substancialmente muitas das deficiências que herdou do passado, às quais acrescentou outras provenientes, nomeadamente, dum período de ruptura e transição política e duma natural imaturidade do regime subsequente.
Como tal, ainda não se consolidou um projecto político consistente, com uma visão de médio longo prazo, liderado por políticos convictos e corajosos, que assumam e se motivem fundamentalmente pelo interesse público, e não pela sua carreira política e pessoal, e que seja merecedor dum apoio cada vez mais alargado da opinião pública.
Esse projecto tem que apostar numa alteração profunda do papel do Estado e do seu funcionamento, num novo modelo social, na abertura definitiva e numa sã concorrência nos vários mercados, e principalmente na libertação da Sociedade Civil, na valorização e qualificação dos cidadãos, na sua iniciativa, e na respectiva responsabilização.
A sociedade civil está prisioneira dum Estado fraco, paternalista e ineficiente que asfixia e desconfia do cidadão e da sua iniciativa, dum enquadramento legal complexo e confuso que condiciona em demasia a liberdade individual e a mobilidade humana e física e dum sistema político que não aproxima os eleitos dos eleitores.
A valorização e qualificação dos cidadãos estão comprometidas por um sistema de educação dispendioso mas ineficaz, que tem como resultados um abandono escolar no ensino obrigatório superior a 40% e uma percentagem de apenas 50% de jovens que completam o ensino secundário.
A responsabilização do cidadão exigirá uma nova cultura e atitude que o leve a assumir-se como responsável pelo seu próprio futuro e da sociedade, exercendo uma cidadania mais activa, procurando a sua auto formação, e abandonando a procura do paternalismo do Estado e duma protecção excessiva que será sempre aparente, fonte de fraudes e injustiças, e não sustentável.
Este projecto político centrando-se no cidadão tem que saber encontrar o equilíbrio certo entre liberdade e igualdade, interesse individual e colectivo e apostar numa repartição justa dos sacrifícios e dos benefícios, não permitindo apropriações indevidas de privilégios por grupos específicos, mesmo que baseadas em supostos direitos adquiridos.
Progressivamente mais cidadãos estão receptivos a aceitar as mudanças necessárias e os respectivos custos, reconhecendo que os seus interesses não estão devidamente defendidos e que a sua realização e felicidade pessoal está cada vez mais comprometida.
O que cada cidadão pretende é estar melhor preparado para os desafios futuros, ter múltiplas opções atractivas e recompensadoras de ocupação profissional e dos seus tempos livres, viver em espaços ambientalmente qualificados e pertencer a uma sociedade bem sucedida que possua também uma elevada consciência ética e social.
Não é isso que actualmente se passa. Por isso prevalece o desânimo, a descrença e o desapontamento.
Temos que ser capazes de construir uma sociedade que vise a maximização acumulada de felicidade de cada cidadão, que acredite nas suas capacidades e iniciativa, e que não o veja apenas como um número num colectivo abstracto, massificado e facilmente manipulável.