Domingo, 5 de Junho de 2005
Modelos sociais
Há qualquer coisa com a superioridade apregoada do chamado “modelo social europeu” que eu não entendo.

E penso que essa superioridade também não tem sido bem compreendida pelos trabalhadores em benefício de quem supostamente foi concebida. Aqueles ingratos, se puderem, emigram para os Estados Unidos. Todos. E não me consta que trabalhadores americanos esperem ansiosos a oportunidade de desertarem o execrando modelo social daquele país com o objectivo de se abrigarem à protecção do nosso. Este é o “acid test”, indesmentível, da comparação entre os dois modelos quanto ao seu mérito visto pelos principais interessados.

O “modelo social europeu” ao querer sobreproteger os trabalhadores que estão empregados, esqueceu os outros: os que não conseguiram a sua inserção no mercado de trabalho ou que a perderam. Para além de subsídios que pesam nas contas públicas mas não resolvem, ou até dificultam, essa inserção. Esqueceu também que há um verdadeiro mercado de trabalho em funcionamento, seja na Europa, nos Estados Unidos ou em qualquer outro lugar. E que quando há intervenção num mercado, por mais bem intencionada que seja, as forças em presença, quando podem, reagem protegendo os seus interesses. O economista brasileiro já falecido Mário Henrique Simonsen documentava a tentação de intervir em mercados e os efeitos perversos consequentes com um exemplo de há quase quatro mil anos, tirado do Código de Hamurabi. O criador do Império Babilónico resolveu fixar o preço do azeite (produto importante na época) e aplicar aos infractores a pena capital. Ao jeito do código que previa outras punições cruéis, seriam executados por fritura no corpo de delito. Nunca conseguiu aplicar a pena. Não por falta de infractores, ou pelo efeito que esperava - conter a especulação - mas sim porque o azeite ao preço fixado desapareceu do mercado. Não havia sequer bastante para as execuções. Boas intenções - com efeito perverso.

A produtividade das economias francesa e alemã ocidental por hora de trabalho supera a produtividade da economia americana. A rigidez do mercado de trabalho induzida pelas regulamentações existentes fazem com que o empresariado prefira investir em tecnologias de alto rendimento a contratar empregados. As máquinas param sem protestos se a procura diminuir. Enquanto que a legislação e os sindicatos tornam difícil a redução da força de trabalho. Aqui o efeito perverso, a consequência imediata não desejada, é o desaparecimento de postos de trabalho. É também regulamentação o que faz com que, no final, a produtividade daquelas economias fique bem abaixo da americana quando medida por trabalhador. Os defensores do modelo social europeu acham que os trabalhadores europeus preferem lazer a rendimentos mais elevados, correspondendo a mais horas de trabalho. E transformaram essa opinião em regulamentação. Não deixando chances aos melhores, legitimamente mais ambiciosos.

O efeito “macro” da abundância e rigidez das regulamentações europeias pode medir-se pela diferença entre as taxas de desemprego. Na U.E. a 15, o dobro da americana. A compensação pela via dos subsídios, a meu ver, não resolve a não ser a curtíssimo prazo - quando se justifica -, antes agrava, o problema, contribuindo para a criação de uma categoria em expansão: a dos desempregados de longa duração. Entretendo-se com pequenas tarefas na economia paralela. Com dificuldade gradualmente crescente para voltarem ao mercado de trabalho, candidatos a descerem abaixo do limiar de pobreza. Claro que há desempregados e pobres nos Estados Unidos. Mas o que se considera limiar de pobreza é aí superior ao europeu (porque a mediana dos rendimentos é mais elevada) mesmo em paridade de poder de compra
São as perspectivas no plano individual, “micro”, que tornam sedutora a emigração para os Estados Unidos. País de oportunidades, onde cada qual pode livremente estabelecer os seus limites ao esforço que dedica a melhorar o seu nível de vida com trabalho. Dispensando protecções e dependências. Liberdade também é isso. Quem gosta de trabalhar aprecia.

O “modelo social europeu” foi concebido por intelectuais desocupados. Aquele perigo. Para ser pago com o dinheiro de todos. Não com o seu. A generosidade do costume. Defendido por outros que vivem da complexidade criada e da conflitualidade que o modelo alimenta. Atribuindo-se autoridade como se fossem gente preocupada com os outros. O “modelo social europeu” morrerá de morte natural. Infelizmente na miséria.



publicado por psylva às 10:36
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