Terça-feira, 20 de Junho de 2006
Perigo: chefia tóxica!
Em todas as facetas da vida existem emoções positivas e negativas. As organizações não constituem excepção. O problema de tais emoções não advém portanto da sua existência, mas da forma como são ou não geridas. Uma expressão de língua inglesa ajuda a perceber o alcance construtivo das emoções negativas: No pain, no gain. Ou seja, a privação e o sofrimento podem ser um factor de amadurecimento e de desenvolvimento. No entanto, para que a relação entre dor e crescimento seja construtiva é necessário que as "dores de crescimento" sejam acompanhadas de esperança, de autoconfiança e da noção de que o objectivo a alcançar (por exemplo, uma mudança difícil, uma fusão com um anterior concorrente) é digno do esforço e das dificuldades que é necessário atravessar.
Lamentavelmente, as emoções negativas são frequentemente acompanhadas de incerteza, de negrume, de pessimismo de medo. Quando tal sucede, a emoção não é construtiva e o sofrimento não gera ganhos de crescimento pessoal. As toxinas, em vez de serem excretadas, vão-se acumulando até tornarem a organização tóxica. Um dos modos mais profícuos de compreender a toxicidade organizacional foi preconizado por Peter Frost, um investigador canadiano recentemente falecido. Frost identificou sete formas de toxicidade, a maioria delas associada ao comportamento das chefias: intencionalidade, incompetência, infidelidade, insensibilidade, intrusão, indutores institucionais e inevitabilidade. Distinguindo estas formas de toxicidade:
Fonte da intencionalidade - explanação: os superiores provocam deliberadamente o sofrimento dos colaboradores; exemplo de comportamentos e ocorrências: o líder ridiculariza, critica em público, ameaça, persegue.
Fonte da incompetência - explanação: os gestores denotam fraca inteligência emocional; exemplo de comportamentos e ocorrências: as promoções são feitas com base em critérios meramente "técnicos", sendo descuradas as capacidades de liderança e de gestão de equipas.
Fonte da infidelidade - explanação: os superiores traem a confiança dos subordinados; exemplo de comportamentos e ocorrências: a confidencialidade é violada, as promessas são quebradas.
Fonte da insensibilidade - explanação: os superiores não compreendem o alcance emocional dos seus comportamentos sobre os colaboradores e são insensíveis aos efeitos dos seus actos sobre as pessoas; exemplo de comportamentos e ocorrências: o impacto emocional das decisões não é considerado e espera-se que os trabalhadores deixem as emoções à entrada da empresa.
Fonte da intrusão - explanação: os superiores fazem microgestão e denotam uma tendência para o controlo total e exacerbado; exemplo de comportamentos e ocorrências: os chefes orientam-se para a gestão dos mais ínfimos e secundários pormenores e não é concedida autonomia aos colaboradores.
Indutores institucionais - explanação: as políticas e as normas organizacionais são inadequadas às realidades, aos problemas e às características dos colaboradores. exemplo de comportamentos e ocorrências: as normas introduzem sentimentos de insatisfação ou injustiça e a norma geral não é adequada para o caso particular.
Fonte da inevitabilidade - explanação: algumas causas de problemas, de toxicidade e de sofrimento estão fora do controlo dos decisores organizacionais, são inevitáveis, mas algumas organizações e chefias levam esta "inevitabilidade" ao extremo ou tomam-na mesmo como uma "vantagem" para os negócios; exemplo de comportamentos e ocorrências: morte de um chefe querido, catástrofe humana, incêndio, desastre, falência de um grande cliente, insucesso rotundo de um novo produto.
A toxicidade assim gerada tem consequências perversas sobre as organizações, as equipas, o desempenho, os colaboradores, as suas famílias e a própria sociedade. Suscita ambientes de desconfiança e de cinismo. Produz aumentos do absentismo, incrementa os abandonos da organização, induz actos de sabotagem, decresce a motivação e o desempenho dos colaboradores. Provoca problemas de saúde e bem- -estar aos seus membros da organização e aos respectivos familiares. Induz o aparecimento de comunidades humanas onde imperam o stress e as consequentes maleitas físicas e psicológicas. Induz, na sociedade, concepções cínicas acerca das organizações e da vida social.
A criação de ambientes salubres, marcados pela perseguição da justiça e do sentido de comunidade, está na origem de organizações de cidadãos, nas quais imperam contributos voluntários para a me- lhoria do sistema e onde a confiança prevalece sobre o cinismo. Como a construção do tipo de ambiente em que se vive e trabalha depende exclusivamente das escolhas individuais, particularmente das escolhas das chefias, tanto a toxicidade como a cidadania são caminhos abertos àqueles que depois os vão trilhar. C
Bibliografia: Frost, P. J. (2003). Toxic Emotions at Work. Boston, MA: Harvard Business School Press.